Ciência – Produto de pesquisa do ObservaPICS
vai compor Museu Nacional da
Fitoterapia
O mapeamento dos serviços de fitoterapia em municípios brasileiros, realizado pelo ObservaPICS entre 2020 e 2021, vai compor um acervo nacional que está sendo montado no Museu Histórico da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. O doutor em saúde pública, colaborador do Observatório e um dos autores da pesquisa, Pedro Carlessi, explica nesta entrevista qual o objetivo desse repositório, como ele está sendo montado e qual a importância de se preservar a memória acerca da temática. Carlessi é um dos responsáveis também por esse novo projeto.
EVIDÊNCIAS – Em que estágio está a montagem do acervo da fitoterapia?
PEDRO CARLESSI – A criação do acervo museológico da fitoterapia pública brasileira integra um trabalho já em andamento pelo Museu Histórico Professor Carlos da Silva Lacaz, da Faculdade de Medicina da USP. O museu atualmente administra mais de 250 coleções temáticas relacionadas à institucionalização das práticas de saúde no Brasil. O acervo em formação irá, então, compor esse conjunto de coleções temáticas por meio das memórias documentadas de pessoas, instituições, associações e municípios envolvidos com a institucionalização da fitoterapia na saúde pública brasileira. O projeto não conta com financiamento direto. Os arquivos têm sido recebidos pelo museu em forma de doação espontânea por parte de seus detentores. Também a equipe de pesquisa, neste momento, trabalha sem orçamento dedicado. Além do meu trabalho na coordenação do acervo, tem sido da maior ajuda a contribuição do farmacêutico Nilton Luz, coordenador da Farmácia Viva do Riacho Fundo (DF), que hoje nos ajuda na compilação dos acervos pessoais que integrarão o museu. Pela equipe do museu, além da curadoria do professor André Mota, historiador dedicado às ciências e saúde no Brasil, o historiador Gustavo Tarelow tem nos dado apoio técnico nos modos de manejo desse material.
EVIDÊNCIAS – Qual a importância desse museu?
PEDRO CARLESSI – O museu possui três atividades básicas: a pesquisa, o ensino e a extensão. Neste sentido, este acervo poderá ser visitado por pessoas interessadas no tema, do Brasil e do exterior, poderá servir como tema formador de futuros pesquisadores e, igualmente importante, servirá para as exposições permanentes e itinerantes que o museu deverá produzir nos próximos anos. Entre essas três finalidades do acervo, é importante destacar sua contribuição para a manutenção da memória e do patrimônio cultural do SUS, e estará à disposição para visitas e consultas a todos os interessados.
EVIDÊNCIAS – Que tipos de documentos vão compor o acervo?
PEDRO CARLESSI – A coleção será formada por arquivos pessoais mantidos por pessoas implicadas com a institucionalização da fitoterapia no Brasil. Há uma diversidade grande de atores envolvidos com o tema: são fundamentalmente profissionais da atenção primária, mas também gestores, deputados, comunidades pastorais, associações de agricultores de plantas medicinais, entre outros. Os registros que estamos recebendo, todos eles em forma de doação, datam diferentes períodos: alguns anteriores ao SUS, outros mais recentes, mas que registram todos eles a ação coletiva da sociedade civil para ter suas pautas, propostas e projetos reconhecidos em forma de política pública. A trajetória da institucionalização da fitoterapia no Brasil é rica em experiências muito contextuais aos locais de onde se originaram. Contudo, essa diversidade é dificilmente percebida no campo da fitoterapia hoje praticada no SUS, que tende a pensar nessa diversidade mais pelas suas semelhanças do que pelas suas diferenças (embora, contrastivamente, resida justamente aí o aspecto mais transformador das propostas apresentadas). A intenção de reunir esses arquivos pessoais é, então, documentar o processo de institucionalização da fitoterapia no Brasil a partir das experiências das pessoas envolvidas, além de proporcionar um reencontro dessas pessoas umas com as outras, e entre elas e suas memórias, todas fundamentais para a construção do sanitarismo pré e pós SUS.
EVIDÊNCIAS – Qual a relação entre a pesquisa em parceria com o ObservaPICS e o projeto do acervo?
PEDRO CARLESSI – A pesquisa que realizei em parceria com o ObservaPICS foi fundamental para despertar o interesse museológico. Naquele momento, tivemos um contato intenso com trabalhadores e gestores de saúde de diferentes regiões do Brasil. Passada a pesquisa, muitas das pessoas entrevistadas seguiram em contato conosco, compartilhando as experiências mais recentes – como a troca de gestão nas prefeituras, a descontinuidade dos trabalhos realizados, ou, ao contrário, a formação de novas equipes e a abertura de novos serviços. Nesse processo, sempre conversamos sobre o projeto inicialmente idealizado no município e suas transformações para ser implementado. Esse é um interesse fundamentalmente direcionado ao estudo de políticas públicas do qual me alinho, mas é também da maior importância para a pesquisa em história da saúde. Para isso, o trabalho realizado pelo Museu Histórico da Faculdade de Medicina da USP é de imensa competência. Além do apoio institucional para acolher permanentemente os arquivos doados para o acervo, o museu conta com uma equipe capacitada para a devida formação de arquivo, documentação e patrimonialização desse material.
EVIDÊNCIAS – Tem data de lançamento do acervo da fitoterapia?
PEDRO CARLESSI – O Museu existe desde a década de 1970. Foi inicialmente nomeado como Museu Histórico da Faculdade de Medicina, e em 1993 passou a se chamar Museu Histórico Professor Carlos da Silva Lacaz – FMUSP em homenagem a seu fundador, reconhecido médico e pesquisador da área de microbiologia e micologia médica. Já o acervo de “acervo museológico da fitoterapia pública brasileira”, que integrará as coleções temáticas do Museu, será oficializado entre o fim deste ano e o início de 2025. Há algumas atividades relacionadas com o lançamento. Em novembro será publicado o meu primeiro livro, chamado A institucionalização da fitoterapia pública brasileira. O livro será lançado pela editora Hucitec e conta com um caderno de fotos que registra parte da memória compartilhada comigo no decurso dos últimos cinco anos de pesquisa sobre esse tema. Em dezembro pretendemos finalizar o depósito desses registros no museu, somados a outros, que estão em fase de coleta. A partir de então o material será gradualmente patrimonializado e estará à disposição para consulta e visita. O acervo poderá ser consultado na integra de modo presencial. Todo material que dele fará parte estará disponível no site oficial do museu, disponível em www.fm.usp.br/museu.
EVIDÊNCIAS – Como pesquisadores de todo o país podem colaborar?
PEDRO CARLESSI – O arquivo está sendo formado pela doação espontânea de arquivos e coleções pessoais. Para isso, estamos contactando a rede de pessoas as quais já identificamos previamente em pesquisas anteriores, mas há ainda o desafio de ampliar essa rede. As pessoas interessadas em contribuir podem entrar em contato direto com o museu: museu.historico@fm.usp.br. EVIDÊNCIAS – Detentores de Saberes tradicionais como indígenas, raizeiros ou representantes de comunidades tradicionais do povo negro ou de origem africana também podem colaborar? PEDRO CARLESSI – Sim, absolutamente. Inclusive, o acervo se dedicada à documentação não só dos projetos que foram efetivamente institucionalizados, mas também as propostas que procuraram reconhecimento sem necessariamente resultar em institucionalidade. Temos registros importantes nesse sentido, expressos por associações indígenas, mas seria fundamental ampliar essa frente de trabalho com novos registros.
EVIDÊNCIAS – O que se pensa em fazer sobre esses povos especificamente? A Oralidade é a forma principal de comunicação dos povos indígenas. Pensa em algum acervo audiovisual?
PEDRO CARLESSI – Nessa fase do trabalho, que é inicial, estamos concentrados em arquivos documentais. O trabalho audiovisual exigiria uma equipe de pesquisa e orçamento o qual a pesquisa ainda não dispõe.
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