Integrando Saberes – Oferendas do Povo Munduruku – Mudi

Desde tempos passados os mundurukus mantêm rituais e práticas de cuidado na sua sociedade. Nessa civilização muito antiga, as pessoas tinham contato com animais e pegavam os filhotes para domesticar e torná-los de estimação. Mas era preciso cuidar bem desses filhotinhos, por isso os tratavam como se fossem seus filhos: boa alimentação e tratamento medicinal. Não deveriam praticar maus-tratos, pois o cuidado com os animais, segundo nossos ancestrais, acalmam os espíritos que partiram deste mundo.
Era necessário cuidar da melhor maneira possível, porque a mãe desse pequeno animal, ao saber que seu filhote estava sendo maltratado, agiria contra quem tem a guarda do animal. Contam os mais velhos que quando um animal não está sendo bem cuidado, em sonho a mãe dele aparece em forma de pessoa e fala avisando da sua inquietação.
Se quem sonhou entregar essa mensagem a quem cuida do animal e esse cuidador entender o recado, nada acontecerá com ele. Tudo estará bem. Mas, se não atender ou não acreditar, certamente essa pessoa sofrerá a consequência. E para evitar isso é preciso fazer um tipo de ritual (oferenda) para acalmar os espíritos. Trata-se de uma cerimônia de oferecimento de uma espécie de mingau ou bebida chamada mudi – mingau de manicuera, mingau de banana, mingau de tapioca feito com castanha do Pará, vinho de buriti, contendo o pirão de farinha, vinho de açaí feito com pirão de farinha, mingau de oxi, mingau de pupunha etc…
De modo algum se pode brincar com animais ou aves, exceto o dono. Esses animais têm uma espécie de vitalidade em si, não é um instinto, chama-se de cewuy, energia que é lançada a pessoa que fala mau ou maltrata, que tira brincadeira de mau gosto ou debocha do mesmo. A mãe natureza toma conta deles, porque na verdade é ela quem cuida, não somos nós que cuidamos.
Acontecem coisas ruins conosco quando não respeitamos os animais. Não é místico, isso é real. Para não acontecer tais tragédias, é necessário seguir essas regras. Tem que fazer o ritual de mudi para acalmar a revolta dos pais, avôs, tios, tias, irmãos e irmãs desse animal. Tem que fazer um banquete para apaziguar a vingança. Só assim, consegue-se a harmonia numa relação com animais ou espírito.
Chibé
Se um ente querido morto, muito amado por nós, vier nos visitar em sonho por várias vezes, pode ter certeza que algo terrível poderá acontecer, a morte virá nos buscar. Para evitar sonhar com essa pessoa, faça uma oferenda pra ela. Quando for dormir, faça o chibé numa cuia, combuca ou mesmo numa vasilha e deixe na cozinha ou na sala que seja no interior da casa. Quando essa pessoa vier visitar, encontrará chibé e acabará tomando. E se ela tomar, pode crer que você não sonhará mais com ela.
Qualquer enfermidade que muitas das vezes acontece é devido a nossas más condutas diante das pessoas, animais, enfim outros. Somos acometidos por tais pragas e sentimos que adoecemos. A causa disso é o nosso mau comportamento diante de certas coisas. Quem faz algo de bom não precisa fazer as oferendas para que nada venha acontecer consigo.
Agowakayce
Karosakaybu fez oferendas para transformar os primeiros mundurukus da época. Agora ele não precisaria oferecer. Fazia isso e oferecia a ele mesmo para transformar os antigos mundurukus. Antes de transformar as mulheres em peixes, já havia feito o ritual das oferendas. Para conseguir a sua mulher de volta do reino das águas, fez uma oferenda. E quando conseguiu trazer sua mulher de volta, fez a oferenda, preparou o mingau de banana para os mundurukus daquela época. E as mulheres fizeram o mesmo para se vingar. Por comerem o ag̃owakayce fizeram com que todos os homens ficassem sem nenhuma esposa e os homens, por sua vez, transformaram-se em várias espécies de animais.
Oralidade
Nosso modo de aprender não se baseia em aprender somente nas escolas. Todos os espaços do território são escola. Na educação escolar dos não indígenas o sistema é muito burocrático, não permite que o estudante saia da sala de aula. A educação indigena é na forma da oralidade. Não somos da era escrita, mas temos o pai da escrita, o grande Muraycoko, que desenvolveu a escrita a partir da tinta extraída do ururcum, de cor avermelhada.
Esses são alguns relatos de crenças do nosso povo, regras que eles deixaram ao longo dos tempos. E até hoje guardam essa tradição. Há tradições não só nas populações indígenas, diversas línguas, povos e nações também guardam suas crenças e rituais.

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