Uma das homenageadas na abertura do 1º Seminário Nacional Sobre Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PICS) realizado nesta quarta (29/09) e quinta-feira (30/09) pelo Conselho Nacional de Saúde (CNS), a pesquisadora Madel Therezinha Luz, de 82 anos – autora do conceito de racionalidades médicas nos estudos de saúde coletiva no Brasil – , destacou a importância da solidariedade para restaurar a saúde.

“Não existe nada pior do que a indiferença com o sofrimento do outro, com a miséria, com a pobreza (…) Independentemente da idade, falta ao ser humano estabelecer relações sociais de solidariedade e acolhimento para que ele se cure e volte a ser saudável”, afirmou para a plateia virtual. Na opinião de Madel, sem solidariedade e acolhimento, condições presentes nas práticas integrativas, não voltaremos  a ter saúde: “As PICS proporcionam esse acolhimento, essa forma de aproximar-se do humano doente que não presenciamos na biomedicina”, observou. “Não estou falando dos médicos, é inegável a dedicação de muitos, inclusive que morreram nessa pandemia. O modo de saber e praticar da atual medicina é que não responde às carências e necessidades do ser humano para a recuperação da vida”, completou. Para a estudiosa das racionalidades em saúde, as PICS podem contribuir muito na restauração do encontro entre vida, saúde e cura.

Madel Luz ministrou a palestra magna de abertura do evento on-line, transmitido pelo Canal do CNS no Youtube, aberto a todos. Socióloga, filósofa e doutora em ciência política, ela define a saúde como “estar na vida de maneira confortável, progressiva, vital, boa”.  Para a pesquisadora, as práticas nomeadas de integrativas em saúde “são uma forma de olhar o viver” e “o estar bem  pertence à humanidade desde o seu começo de caminho pela civilização”.

Na concepção da pesquisadora, a vida se aplica também aos outros seres vivos e aos elementos que formam a dinâmica do planeta Terra. “A cura é o que fazemos, o modo como agimos quando essa dinâmica entre vida e saúde é posta em questão por algum motivo, interno ou de alguma contaminação externa à nossa dinâmica”. Segundo Madel Luz, atualmente o planeta está contaminado por questões que dizem respeito mais à doença e à morte e menos à saúde e à vida, dentre as quais os efeitos climáticos, epidemias, endemias, doenças coletivas não necessariamente transmissíveis, mas que se estabelecem pelo uso contínuo e exagerado de medicamentos. “Uma das formas de adoecimento mais graves é causada pelo consumo excessivo de biofármacos”, alertou, apontando para a dependência que se configura em muitos casos, com impacto no funcionamento do organismo. Essa medicalização não teria por finalidade a cura, mas a venda do produto.

Sobre as práticas integrativas, Madel afirma que a pluralidade e a diversidade delas “nos levam a pensar que não existe a medicina, existem medicinas, muitas e várias formas possíveis talvez de integrar os procedimentos que se originam dessas medicinas”. Para a cientista social, “não é preciso negar a existência ou validade de um modo de meditar, de um chá ou gotas de um tipo de planta”. E sem amizade e uma nova forma de associação do humano consigo mesmo não se terá saúde. Confira o vídeo das apresentações do dia 29 de setembro do seminário do CNS.

ESPAÇO MADEL LUZ

A coordenadora do ObservaPICS, pesquisadora da Fiocruz Islândia Carvalho, anunciou, durante o seminário, a criação de um espaço no site do observatório que reúne toda a obra de Madel Luz de interesse dos estudos sobre PICS. São artigos, aulas e outras produções da professora aposentada das universidades federal e estadual do Rio de Janeiro (UFRJ e UERJ) disponíveis a quem se interessar pelos temas das racionalidades médicas e concepções de saúde refletidas por Madel. “Mais do que construir conceitos, Madel nos ensina a importância de refletir sobre a construção do conhecimento”, destacou Islândia Carvalho. O espaço deve ser atualizado inclusive com novas produções da autora.

“É uma surpresa, fico muito feliz”, reagiu Madel Luz ao saber da homenagem. “Nunca consegui dar aulas sem acrescentar reflexões sobre aquilo (…) é a minha formação meio francesa, meio Pierre Burdier”, observou. Uma pesquisa, segundo Madel, “tem que levar para outras perguntas, procurar outras coisas”. Ela nunca quis fechar a produção acadêmica num produto, optando por compartilhar com as pessoas para que elas posam criar outras coisas contra ou a favor. “Não importa a visão, é só fazer avançar o conhecimento”.

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